domingo, agosto 27, 2006

Sacudir a toalha...

Sacudo a toalha
E espalho ao vento pequenos pontos brilhantes.
Com a areia vão todos os segundos, os momentos daquela tarde de praia.
A areia era quente, a água gelada e límpida, o teu corpo um cais seguro...
Olhas-me com olhos de miúdo, olhos em ponto de interrogação. E ris... e fazes-me rir!
O tempo passa a correr quando não sentimos o sol, nem o vento... só aquele quadrado de areia em que estendemos toalhas e deixamos os minutos contar.
Mas agora sacudo a toalha... se calhar o Verão acabou um pouquinho, ao acabar esta tarde.
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Olho os pontos que se espalham no ar, voltam à areia de onde os agarrei... levo alguns na pele, junto com o sal da água e do teu beijo.
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E trago toda a praia comigo...

sábado, agosto 12, 2006

Mulheres

Vão pelo caminho romano, ladeado de silvas e cardos roxos. Lenços, chapéus de abas largas, a saia e o avental muito pretos, tão pretos como a saudade...
Levam sachola, balde, pão e vinho para quando a fome apertar e as gargantas secarem.
Caiu a noite há pouco.
Cantam


Se fores à erva, vai ao Valadinho...
No rosto, estão marcadas muitas mais modinhas, a cantiga dos dias de trabalho de sol a sol, o entoar dos cânticos de Igreja, misturados com a realidade de trabalhar a terra...
Tomai e recebei, as horas do meu dia
Alegrias e dores, penas e trabalhos...
São as mulheres que passam para o campo.
São as minhas avós, semente e terra da vida dos meus pais, eco intemporal que me chega agora, ao anoitecer, nessa hora antiga de saídas para a rega, para uma noite inteira de trabalho ao luar.
São a fibra de que os meus pais me fizeram, a parte de mim que chora quando tem de partir, sair das leiras verdes, abandonar a vinha e os campos de milho de uma infância que não podia ter sido mais feliz.
Já não nos acompanham nos trabalhos do campo, já partiram a dar graças ao Senhor que sempre acreditaram em vida. Mas olham por nós, continuam a velar pelos que cá ficaram.
Não sei porquê, mas sei que sim.

segunda-feira, agosto 07, 2006

Cabeça cheia \ Cabeça vazia

Há qualquer coisa no tempo de férias que me desassossega. Neste tempo em que é suposto não pensar em nada sério, como o caso de empregos, aulas, exames, livros, em que deviamos andar de cabeça leve...
... há qualquer coisa de difuso que me enche a cabeça. Um zumbido constante de uma preocupação que eu sinto que DEVIA ter, mas não tenho, de horas certas que eu DEVIA seguir, mas que ignoro, de coisas inadiáveis que DEVIA cumprir, mas que deixo arrastar...
Não é certa ainda esta teoria, mas começo a achar que o nosso cérebro, que fervilha durante todo um ano de compromissos e prazos, chega ao fim de Julho, quando devia desligar, e não consegue. Como uma máquina que sobreaqueceu e na qual os botões deixaram de funcionar! Como se a lei da inércia se aplicasse também aos processos mentais...
Talvez este meu princípio de teoria seja um sinal de como o calor que entra pela janela me anda a afectar. Mas também não quero saber... e o cérebro continua ocupado com tanta coisa, que porei mais esta em lista de espera!

Desliga, cabeça... e deixa-me descansar só um pouco!

terça-feira, agosto 01, 2006

Não




Não: devagar.
Devagar, porque não sei
Onde quero ir.
Há entre mim e os meus passos
Uma divergência instintiva.
Há entre quem sou e estou
Uma diferença de verbo
Que corresponde à realidade.
Devagar... Sim, devagar...
Quero pensar no que quer dizer
Este devagar...
Talvez o mundo exterior tenha pressa demais.
Talvez a alma vulgar queira chegar mais cedo.
Talvez a impressão dos momentos seja muito próxima...
Talvez isso tudo...
Mas o que me preocupa é esta palavra devagar...
O que é que tem que ser devagar?
Se calhar é o universo...
A verdade manda Deus que se diga.
Mas ouviu alguém isso a Deus?
Álvaro de Campos
(leituras deliciosas em tempo de férias...)