sexta-feira, novembro 17, 2006

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Olho através de fragmentos de vidro coloridos. Estou deitado no chão, como em cima do Mundo, e lá acima uma clarabóia mostra-me um céu multicolor.
É um céu distorcido, este. Uma mesma nuvem mostra-se-me em diferentes cores, azul, amarelo, roxo, verde... como uma manta de retalhos estendida por sobre a estratosfera. Onde está o meu feijoeiro mágico, como posso subir e enfrentar monstros de contos de fadas? Não há, e a única porta que se abre para fora deste quarto dá acesso à realidade.
Apetece-me ficar por aqui, poder ver sempre o Mundo por vidros multicolores, distorcido mas apetecível. Ou partir a clarabóia em mil pedaços, e poder levar comigo todas aquelas cores.
Devaneios, viagem, só... A realidade espera-me teimosamente, de pés fincados no chão, lá fora. E eu preciso de me levantar. Só que a gravidade tem a força de cem gigantes, prega-me ao chão e pisca-me o olho, enquanto serve a minha preguiça.
Cerro os dentes, apoio as palmas das mãos no chão, chamo forças que não tinha aos músculos que estiveram sempre ali, distraídos de mim. Elevo-me sobre as mãos, sento-me. Os meus olhos ficam mais perto da clarabóia, assim. E tentam-me.
Não resisto. Levanto-me e estendo a mão. Os encaixes da pequena janela redonda saem do lugar, pela simples vontade dos meus dedos... e todas aquelas cores se precipitam para o chão, os cem gigantes a ajudar-me. Espalham-se pelo quarto, em sons de estilhaço.
Baixo-me, recolho todas as cores, e saio porta fora com o bolso cheio de sonhos...

sexta-feira, novembro 03, 2006

Anjo

Porque surgiste do nada e começaste a caminhar a meu lado. Revelaste-te, revelei-me, conheci-me. Descobri que e bom conhecer pessoas como nos. E foste riso, conversa fiada, tontices a mesa do lanche.
Porque ajoelhaste perto de mim e me cobriste com as tuas asas, quando eu so queria esconder-me do Mundo e sofrer para mim. E me deixaste estar so, continuando ao meu lado, como eu precisava.
Porque beijaste as minhas lagrimas e as fizeste parar, me abraçaste com a força do Mundo e me obrigaste a enfrentar os meus fantasmas.
Porque os afectos criam habituaçao e dependencia, nos fazem fortes em gestos tao pequenos, nos insuflam coragem em sopros indistintos.
Porque nao me abandonas, mesmo se te decepciono... Nao me julgas, mesmo sendo a voz de uma consciencia que insisto em esquecer... Nao me evitas, mesmo conhecendo o pior que ha em mim.
Porque es tu...
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...mas ha quem insista em negar-te a entrada no Ceu a que pertences. Querem cortar-te as asas, rasgar-te as vestes, abandonar-te aos lobos.
E eu aqui, impotente perante semi-deuses todos-poderosos, incapaz de retribuir os gestos, a tranquilidade.
So posso sentar-me a teu lado, e esperar que os meus braços que te rodeiam sejam o bastante para te proteger da tempestade.
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(estava guardado num dos meus cadernos ha coisa de uma semana, no dia em que fiz um pedido importante a uma pessoa importante. Obrigada por teres estado la, comigo. E escrevo-o agora por ter ainda mais a certeza de tudo isto. Sem o teu fervor da Queima, mas completamente sentido, so posso dizer "Miudo, adoro-te!")