terça-feira, julho 31, 2007

Regressos

"Quem és?" perguntou ela ao senti-lo respirar atrás de si, inseguro... A resposta foi um beijo nos cabelos, a medo... "Sou eu, não me reconheces?", e de tanto que era o tempo que já tinha passado, a pergunta hesitava, com medo da resposta... Mas ela procurou-o, as suas mãos, estreitou-as na cintura, fechou-se no seu abraço.

"Tinha medo que não viesses, estiveste tanto tempo longe que pensei que me esquecesses..." e sorria, ao ver que se tinha enganado. Voltou-se e beijou-o na testa "Bem-vindo de volta" Ele estava ali, sujo, afogueado, acabado de chegar sabe Deus de onde, e vinha procurá-la.

O tempo tinha passado por ele, notava-se-lhe no olhar e nos cabelos com toques de branco, a barba crescida, a voz mais funda, marcada de vivências que ela nem queria adivinhar. Mas o sorriso mantinha-se inalterado, verdadeiro e feliz.

"Passei tantos anos com a tua imagem na minha cabeça... continuas linda! Desculpa..." mas ela calou-o, a saudade rebentava-lhe do peito, não precisava de desculpas, só o queria ali, pertinho, protector.

Levou-o pela mão, entraram na casa que ele já conhecera, mas que o tempo moldara e reconstruíra, percorreram todas as divisões, os passos dele a medo, porque tudo era novo,afinal.

Era um regresso de silêncio, não feito de ressentimentos nem de culpa, mas de paz, um regresso definitivo.

Pararam na entrada do quarto, o quarto que fora sempre o dela, mas ao qual ele conhecia cada recanto, e cada odor. Cheirava a jasmim, como o corpo macio dela. Passassem mil anos, e ele continuaria com o seu cheiro marcado a fogo, e reconhecê-lo-ia entre outros mil...

Acudiram ao chamamento daqueles lençóis meios desfeitos que ela abandonara minutos antes. "Não conseguia dormir" justificou-se ela, "sabia que andavas por perto, só podias ser tu"

E a cama acolheu-os aos dois, que se tornavam um só... porque os regressos não pedem justificações, não desenham culpas nem acordam remorsos... os regressos são feitos de entrega.

E entrega será, por entre as dobras dos lençóis mornos, até à madrugada...