Tenho a mesa cheia de trabalho. Folhas espalhadas, esquemas, tabelas, imagens, pelo meio de letras minúsculas a darem-se ares de códigos indecifráveis.
No meu lugar cativo no café da rua, a agitação próxima ajuda à concentração. Ajo como se o espaço já fosse meu, peço o café do costume, e estudo.
Desfilam nomes, teorias, métodos... listas intermináveis que urge saber, pessoas e locais que nunca conheci, mas que parecem imprescindíveis ao meu futuro.
Estou cansada disto, do saber falso, feito de engolir e vomitar conhecimentos alheios, a História dos outros.
Encosto-me na cadeira, afundo-me um pouco (é já um hábito), e viajo...
O dia que passa lá fora está cheio de Sol, não parece Inverno, não parece Vila Real. E as pessoas notam-no, saem à rua como em agradecimento.
As manhãs de luz põem-nos sorrisos nos passos. Queria poder caminhar... Sorrio para outras manhãs, outros dias feitos de luz. Afinal, já passou tanto tempo.
O presente não deixa espaço para me encher desta luz. A realidade resume-se aos livros. Antecipo os dias que aí vêm, sem a pressão de hoje. Falta tanto, e na verdade já não falta quase nada.
Volto à Terra. O barulho no café cresce, agrada-me este tilintar constante de copos e chávenas, a conversa amena das senhoras da outra mesa, a correria dos funcionários de lado para lado, que me esquecem porque eu estou sempre aqui.
E os papéis ali. Cheios de notas, sublinhados de desespero, à minha espera. Sempre à minha espera.
Mergulho de novo nas folhas, luto com os nomes, é difícil apropriar-me de tantas pessoas e das suas almas.
Cheia de tudo... vazia de mim.
8 comentários:
"A realidade resume-se aos livros." muito, muito, muito infelizmente! =/
Passamos a vida sem a passar como deveria ser passada. E tudo porque um monte de livros esperam a nossa leitura, esperam nos ensinar algo como se nós quisessemos mesmo saber.
"Cheia de tudo...vazia de mim" linda frase, mau exemplo. Assim que esse fardo passar venha-me visitar e voltará a ficar cheia de muita risota! =P
Beijoca*
Porte-se bem!
O quotidiano nessa chávena de café que me deste a beber... Sentir...
Saudação a ti...
"Estou cansada disto, do saber falso, feito de engolir e vomitar conhecimentos alheios, a História dos outros"
Até certo ponto compreendo a acidez das palavras, mas, reflecte lá um pouco... porquê saber falso? pode ser monótono, aborrecido quem sabe inútil...mas falso? porquê? A História dos outros poder vir a ser útil para o desenhar da tua própria História, para aprenderes com o que os outros já presenciaram...enfim muito para contar e pouco tempo para o fazer...
Aprecia Vila Real, é um nativo que te fala...
é um desabafo, caro luis, resulta de dois meses da mesma rotina... e nao desprezo a História, nem os conhecimentos que preciso para o meu futuro... so me entristece ter de ser assim, em pastas de arquivo, 600 paginas de cada vez, com nomes, datas e factos aleatorios... sinto que entra por um lado e sai pelo outro...
Beijo, agora de ferias...
Eu percebo-te, e como... Mas aproveita agora as "férias" para viver mais a tua História e menos a História dos outros. Beijo
vou gostar de conhecer esse café. ;)
De tudo o que li só o desassossego ficou...e uma certa anologia de mim. As almas, essa...não vi pois cedo violei o decreto da maior idade.
Excelente!!!
Beijo
Gostei... bonito texto e foto interessante :)
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