Olho através de fragmentos de vidro coloridos. Estou deitado no chão, como em cima do Mundo, e lá acima uma clarabóia mostra-me um céu multicolor.
É um céu distorcido, este. Uma mesma nuvem mostra-se-me em diferentes cores, azul, amarelo, roxo, verde... como uma manta de retalhos estendida por sobre a estratosfera. Onde está o meu feijoeiro mágico, como posso subir e enfrentar monstros de contos de fadas? Não há, e a única porta que se abre para fora deste quarto dá acesso à realidade.

Apetece-me ficar por aqui, poder ver sempre o Mundo por vidros multicolores, distorcido mas apetecível. Ou partir a clarabóia em mil pedaços, e poder levar comigo todas aquelas cores.
Devaneios, viagem, só... A realidade espera-me teimosamente, de pés fincados no chão, lá fora. E eu preciso de me levantar. Só que a gravidade tem a força de cem gigantes, prega-me ao chão e pisca-me o olho, enquanto serve a minha preguiça.
Cerro os dentes, apoio as palmas das mãos no chão, chamo forças que não tinha aos músculos que estiveram sempre ali, distraídos de mim. Elevo-me sobre as mãos, sento-me. Os meus olhos ficam mais perto da clarabóia, assim. E tentam-me.
Não resisto. Levanto-me e estendo a mão. Os encaixes da pequena janela redonda saem do lugar, pela simples vontade dos meus dedos... e todas aquelas cores se precipitam para o chão, os cem gigantes a ajudar-me. Espalham-se pelo quarto, em sons de estilhaço.
Baixo-me, recolho todas as cores, e saio porta fora com o bolso cheio de sonhos...